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Victor Humberto Maizman - O cobrador de impostos

Victor Humberto Maizman Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.

29/09/2021 01:14:11
Reprodução

Mateus é, sem dúvida, um dos apóstolos mais famosos de Jesus. Segundo conta o próprio Evangelho de Mateus, dedicava‐se a cobrar os impostos. Eis o relato: "Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança, e disse‐lhe: Segue‐me. E ele levantou‐se e seguiu‐o (Mt 9,9‐11)".

Desde então, tornou-se um dos mais assíduos seguidores de Cristo. Acompanhou Jesus durante boa parte de sua vida pública e, após a sua morte, começou a pregar na Judeia e em países próximos, com uma vida marcada pela pobreza.

Queria apresentar aos outros o verdadeiro tesouro, qual seja, a Vida Nova em Cristo. Mateus foi o primeiro apóstolo a escrever um livro contando a história de Jesus e seu Evangelho foi muito usado pelos primeiros cristãos.


Pois bem, a passagem bíblica mencionada se tornou importante porque na época os impostos exigidos pelo Império Romano eram demasiadamente onerosos, ao ponto de que seus coletores eram comparados aos próprios carrascos, ambos temidos e hostilizados pela sociedade.

Não por isso ao longo da história as grandes revoluções tiveram como pano de fundo a dominância de reinados sobre os povos, onde o poder estatal era exercido com a força da espada posta sobre os pescoçõs dos súditos.
No Brasil Colônia, o fato histórico foi a derrama, qual seja, foi um dispositivo fiscal aplicado no Estado de Minas Gerais a partir de 1.751 a fim de assegurar o piso de 100 cem arrobas anuais na arrecadação do quinto. O quinto era a retenção de 20% do ouro em pó ou folhetas ou pepitas que eram direcionadas diretamente à Coroa Portuguesa.

Daí surgiu a revolta comandada por Tiradentes.

A partir de então, as Constituições Federais vieram ao longo do tempo assegurando garantias mínimas aos contribuintes, uma vez que pagar tributo, nada mais é do que transferir de forma forçada parte do patrimônio do contribuinte ao Estado.

E de fato uma das garantias constitucionais mais caras vigentes em nosso sistema normativo é aquela que veda que o tributo tenha efeito confiscatório, quer dizer, que comprometa a própria sobrevivência do contribuinte.

De salientar que muito embora não conste da Constituição algum parâmetro numérico ou percentual que possa definir de forma objetiva o valor de um tributo confiscatório, é certo que tal princípio orienta para que a legislação não seja abusiva.

Aliás, decorre desse princípio maior, a regra constitucional que impõe que quanto mais essencial o produto, menor deve ser a alíquota do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias, o ICMS.

Nesse sentido, venho de forma recorrente apontando que tanto nos combustíveis, como a energia elétrica, será inevitável a intervenção do Poder Judiciário para poder fazer prevalecer a garantia constitucional que veda a incidência fiscal de forma desproporcional e manifestamente onerosa para o contribuinte.

E, sem prejuízo da garantia da vedação ao confisco, também a própria Constituição em vigor veda que sejam utilizados de mecanismos abusivos de cobrança, principalmente que tenha o condão de minimizar a própria dignidade do contribuinte, seja decorrente de apreensões de mercadorias, como também de outras formas onerosamente coercitivas.

Sendo assim, como já mencionado, a história nos conta, inclusive através dos escritos bíblicos, que a cobrança abusiva de tributos, seja em razão do valor ou da forma, já motivou mudança de credos e deu início a revoluções.

Portanto, a expressão popular de que a parte mais sensível do homem seja o bolso, embora tenha uma carga de ironia, na questão tributária podemos dizer que esteja diretamente ligada a própria dignidade do contribuinte.


Victor Humberto Maizman
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